O projeto Caderno de Artista, idealizado pela curadoria de dança do CCSP, tem a intenção de acessar procedimentos de criação ou, por assim dizer, a materialização de um pensamento em processo.
Convidamos coreógrafas(os) a compor uma obra audiovisual sobre modos de criação, entendimentos de dança, corpo e movimento, referências, matérias-primas e fases.
Os cadernos produzidos dentro do programa serão incorporados ao Arquivo Multimeios do CCSP, referência em acervos de arte e um dos principais de dança do país, contribuindo para a sua atualização com informações sobre importantes criadores de dança que ainda não tiveram suas obras catalogadas.
Na sexta edição do Caderno de Artista, a artista Luciane Ramos-Silva apresenta a obra Profusão.
Profusão
Cenas, interrogações, escritas, movimentos e outras cositas organizadas neste pequeno vídeo são um recorte de interessâncias para o momento presente. Nele compartilho percepções de mundos e como tenho me movido neles. Longe de querer desenhar um resumo desta que é ainda uma curta trajetória, se comparada às das grandes figuras que fundamentam meu trabalho e minha ancestralidade, olhei para urgências, modos de fazer e entrelacei escritas de mim e de muitas gentes, atos criativos de fissurar, de tremer, de amar. São tempos, territórios, espaços, formas de mover e memórias de futuro. Foi um olhar para trás e para adiante, sem pensar em “passado” ou “futuro” (porque já dizia o mestre: “o passado está às nossas costas ou à nossa frente se dermos meia volta”). Foi um olhar ao redor, aos desejos e até mesmo as questões políticas e éticas incrustadas no que me dança. Na coreoedição atentamos também para dentro, entranhas, líquidos (e ares que perdemos neste fatídico 2020).
Da cidade que habito e amo (sem deixar de sentir sua face dura) trago familiaridades, paisagens opostas, proximidades e lonjuras que mostram as contradições implicadas no movimento e que os percursos curvos e espiralados podem fazer com que não entremos na contramão. No mais, são só algumas danças entre outras que virão.
Luciane Ramos-Silva
Artista da dança, antropóloga e curadora independente. É doutora em Artes da Cena e mestre em Antropologia pela Unicamp. Tem especialização em diáspora africana pelo The David C. Driskell Center da Universidade de Maryland. Nos últimos dez anos desenvolveu danças, parcerias e projetos na interface entre corpo, cultura e colonialidade, aprofundando as relações sul-sul entre o Brasil e contextos da África do Oeste, estudando sentidos para um corpo em diáspora. Sua tese de doutorado foi um mergulho nas ideias de colonialidade na dança e nas pedagogias afro-orientadas. Atua como professora de dança na cidade de São Paulo e pelo Brasil afora. Nos últimos três anos foi professora convidada (oferecendo workshops e participando de residências, seminários e conferências) na Duke University, Michigan University, Amherst College, Hampshire College e Brown University. Algumas de suas obras: Ativação para Arqueologia Marítima (Bienal/2014); Olhos nas Costas e um Riso Irônico no Canto da Boca (2018); Brita (2018), Na Fresta da Certeza, o Vermelho Escuro (2017/2018). Gosta de se juntar com gentes para produzir novos mundos.