A Virada Cultural 2025 recebeu no Centro Cultural São Paulo Tom Zé, um dos nomes mais inventivos e inquietos da música popular brasileira

Por Fellipe Cartier | Redação CCSP | Fotos: Nina Gocke

A fila que chegava no viaduto Beneficência Portuguesa foi a mesma que lotou a sala Adoniran Barbosa no Centro Cultural São Paulo no dia 25 de maio. Ou melhor, não foi. Muita gente ficou de fora. E isso chamou atenção do próprio artista: “Quando eu cheguei aqui no Centro Cultural eu pensei que ia fazer um show, quando eu vi a animação, o calor humano do pessoal… Ahhh eu vou fazer um show de arrasar”!, disse Tom Zé, que entrou em cena às 19h.

E arrasou! Mostrou mais uma vez por que sua obra permanece tão atual quanto indispensável. Fãs dedicados e novos admiradores, lotou o espaço, evidenciando a relevância contínua de sua obra.“Como se você não fosse um show por si só, né Tom?! E com esse grande time é tudo na escala maior!” afirma o músico Nicolau Araujo no instagram do CCSP (@ccspoficial). Eleide Gonçalves, especialista em Gestão Pública concorda: “O show foi um verdadeiro ESPETÁCULO! Tom Zé é sensacional – e festejamos sua plena recuperação, fazendo estripulias no palco! Viva Tom Zé!”.

Foi uma celebração da potência criativa e da liberdade artística. Aliás, sua habilidade de conectar-se com a plateia é um testemunho de sua maestria artística. Poucos conseguem. Manteve uma comunicação poética e envolvente, utilizando sua voz e gestos para transmitir emoções e histórias. Cada canção, cada pausa, cada fala, exalavam poesia e provocação – marcas registradas de sua trajetória. Sua presença em cena é performática, um teatro musical em que a palavra, o ruído, o sussurro e o silêncio compõem juntos uma linguagem única.

Ao final, recebeu todos e fez questão de gravar vídeos com todos: “Prefiro vídeos porque consigo colocar a emoção que tô sentindo em conhecer você!”, disse ele para esse jornalista. Demonstrou que sua energia e eloquência continuam intactas, encantando o público com sua presença única. Sua capacidade de se comunicar de forma poética e sua liberdade criativa são legados que perduram, mostrando que a arte transcende qualquer barreira.

Arte livre que desafia o tempo

Nascido em Irará, na Bahia, em 1936, ele foi um dos expoentes do movimento tropicalista ao lado de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Gal Costa, mas sempre trilhou um caminho próprio, mais experimental, mais ousado e mais desobediente. Formado pela Universidade da Bahia, Tom Zé sempre misturou música, ruído, poesia e crítica social com uma liberdade estética rara.

Aos 88 anos, artisticamente potente, eloquente e absolutamente livre. Inclusive a música O “Riso e a Faca” que abriu seu show faz jus a isso:

Fiz meu berço na viração
Eu só descanso na tempestade
Só adormeço no furacão

Frases tocantes de uma sequência de músicas consagradas que fez com que todos dançassem juntos com o compositor baiano: ‘Tô’, ‘Hein?’, ‘Jimmy,Renda-se’, ‘Menina, Amanhã de Manhã’, 2001 (Os Mutantes cover)’, ‘A Felicidade (Tom Jobim & Vinicius de Moraes cover)’, ‘Aviso aos Passageiros’, ‘Não Urine no Chão’, ‘Amarração do Amor’, ‘Augusta’, ‘Angélica e Consolação’, ‘Não Tenha Ódio no Verão”, encerrando com ‘Politicar’.

Claro que o público, já seduzido por ele, pediu bis e voltou com ‘Parque Industrial’. A música é uma crítica afiada ao processo de industrialização, exploração da classe trabalhadora e às desigualdades sociais no Brasil. Ela faz parte do disco Tropicália ou Panis et Circencis (1968), um marco do movimento Tropicália, que misturava música popular brasileira com crítica social, arte de vanguarda e influências estrangeiras.

Uma epopeia musical, com certeza!

O show foi mais do que uma apresentação, foi um manifesto de resistência artística. A vitalidade criativa de Tom Zé não apenas resiste ao tempo, ela desafia o tempo. Sua arte, marcada pela experimentação e pela liberdade de pensamento, continua a tocar e a transformar. E enquanto houver palco e ouvidos atentos, Tom Zé seguirá sendo necessário.

plugins premium WordPress