Grupo de dança faz releitura do sagrado tradicional com a expressão corporal
Por Alexandre César | Redação CCSP | Fotos: Arquivo pessoal
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Na última quarta-feira (11), o Clarin Cia. de Dança apresentou o espetáculo Terra de Águas e Cazumbás, no Espaço Cênico Ademar Guerra, no Centro Cultural São Paulo (CCSP), trazendo uma releitura da tradicional brincadeira do Bumba-Meu-Boi do Maranhão, com as modernas linguagens de expressão corporal.
Na brincadeira, aparecem os conhecidos personagens do folguedo, como os pagadores de promessas que pedem graças à São João, e seres do fantástico, com danças, toques de chocalhos, representando a vida pastoril do Nordeste, índias, vaqueiros, o coronel, além, é claro, dos personagens principais, o Boi Barroso, e os escravos Pai Francisco e sua esposa grávida, Catirina.
Através da dança, a lenda do Boi Barroso foi contada de como Catirina, com desejos de grávida, exige de Pai Francisco – Mateus, nos demais Estados do Nordeste – que mate o boi do Coronel, pois anseia comer a língua (ou o fígado em outras versões) do animal. Ao saber da morte de seu boi, o Coronel jura ‘justiçar’ o autor, ao que Pai Francisco convoca um pajé que revive Barroso com entoação de loas.

O show começou com cânticos de Rezadeiras e Lavadeiras, seguidos com temas católicos, além de músicas de mestres de Boi famosos, como Coxinho de Pindaré, quando tocou o sucesso Urrou: “Lá vem, meu boi urrando, subindo o vaquejadô, deu um urro na porteira, meu vaquêro se espantô, o gado na fazenda com isso se levantou. Urrou, urrou, meu novilho brasileiro, que a natureza criou…”
O Bumba-Meu-Boi do Maranhão possui três fases, sendo o Batizado, as Brincadas/ Apresentação e Morte do Boi. Kelson Barros, produtor Clarin, preocupou-se em mostrar a etapa da Morte do Boi, além de frisar sobre as diferenças das tradições tanto das agremiações do resto do Nordeste, como do próprio Estado do Maranhão.
Quando pretendíamos montar esse espetáculo, fizemos muitas pesquisas com os grupos de diversas regiões do Maranhão, e percebemos que muitas delas contavam algumas diferenças nas lendas, nas peças das indumentárias dos participantes, algumas variações nas letras das canções, algumas cantavam temas religiosos, outros, nem tanto. Então, percebemos que tudo aquilo faz parte de uma tradição, não existe o ‘certo’ e o ‘errado’, mas a maneira como aquele grupo faz o Boi, de acordo com sua própria tradição e de sua região. Tive o privilégio de conhecer um mestre de Boi, que herdou o grupo após a morte de seu pai, e ele deu outro ritmo às músicas de sua agremiação, pois não gostava do compasso lento quando seu pai comandava o grupo. Essas mesmas diferenças eu percebo nos outros Estados do Nordeste, a cultura é a mesma, mas apenas com algumas diferenças, o nosso Pai Francisco é o Mateus em outras regiões, assim como as Índias ganham o nome de “Caboclas” em outros Estados. No lado do sagrado, o Bumba-Meu-Boi é uma festa religiosa em que muitos devotos de São João fazem promessas para seus filhos e netos pagarem quando a graça é alcançada ou quando já se cumpre antes do Santo atender ao pedido, e tem gente que entra pra brincadeira e não larga nunca mais. Eu mesmo danço Boi desde criança, e cresci achando que sabia de tudo, foi crescendo e estudando que percebi que ainda havia muita coisa pra aprender – enfatizou o produtor.

Emocionada na plateia, estava a maranhense, e educadora social, Bel Carvalho, que está há 37 anos residindo em São Paulo, mas que nunca deixa de visitar sua Cururupu, cidade que fica a 465 km de São Luís. Na ocasião, ela aproveitou para tirar uma foto com a índia Renata Damasco.
Eu acho maravilhoso isso. A gente depois que sai da nossa terra e vem para uma cidade grande como São Paulo, que tem diversas formas de cultura, diversas formas de informação, e então você chega e assiste um espetáculo desse, a emoção é muito forte. O CCSP nos proporciona um grande momento de prazer, quando nos traz uma cultura que é nossa, que onde eu nasci, cresci, de uma família que fazia tudo isso, porque eu sou de uma família de brincante, brincante cantor, é o que a gente fala que são os contadores, os cantadores e as pessoas que fazem Boi no Maranhão – testemunhou.
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