O CCSP indica o perfil @museudoisolamento, um museu inteiramente online que faz a ponte entre a produção artística independente e quem está em casa. Nesse novo formato, artistas de todo o país têm encaminhado suas obras ao projeto por meio de um formulário, e o resultado é uma curadoria de múltiplas linguagens que tem alcançado muitas pessoas.
Conversamos com Luiza Adas, a idealizadora do projeto, sobre as ideias de um museu online e como fica a arte durante a quarentena. Confira a seguir a entrevista sobre o Museu do Isolamento Brasileiro:
CCSP – Como você vê o impacto do atual contexto na produção e consumo das artes? Conte mais sobre o Museu do Isolamento Brasileiro e como ele se encaixa nesse cenário.
Luiza – É difícil falar de uma grande movimentação quando se está nela, né? É tudo muito novo e repentino. Eu acho que a produção e o consumo de arte dependem muito dos estímulos que se recebe dentro e fora de si: sair de casa nos torna mais criativos, claro, mas essa situação toda é também muito oportuna pra que artistas se permitam parar, escutar, se entender e produzir. São cenários igualmente frutíferos. E o MI surge entre essas duas situações; é uma plataforma de difusão da arte que tá “lá fora”, e que traz arte e reflexão pro isolamento das pessoas.
CCSP – Você acha que a internet mudou o consumo de arte independente?
Luiza – Por mais que a gente se depare com um ambiente mais democrático na internet, o que chega pra nós é um reflexo do que a gente mesmo movimenta… A internet potencializa as discussões que a gente mesmo propõe, tanto no online quanto no offline. Sinto que na medida em que a arte independente consegue tornar públicas determinadas reflexões, determinadas críticas e conceitos, ela ganha espaço na sociedade brasileira. Isso nas artes plásticas, que é o que eu mais tenho contato. Quanto mais prática, mas engajada e mais sintonizada com as discussões, mais espaço essa produção ganha no mundo virtual.
CCSP – No site do projeto consta que o MI é o primeiro museu online do Brasil. Você pode nos contar mais sobre essa ideia de “museu online”?
Luiza – Sobre isso, eu tenho dois pontos. Geralmente, quando você pega galerias, museus e tudo mais, existe um contrato mais burocrático que barra a expansão dos artistas modernos; um museu online é mais livre nesse sentido, por não ter tanta burocracia ou a necessidade manter uma autoridade. O MI tem essa brecha, essa independência, pra ser um espaço de exposição para artistas em qualquer ponto da carreira ou do país. Outro ponto é que um museu online tem uma “democracia” muito maior em termos de acesso – todas as pessoas com acesso à internet verão exatamente o mesmo acervo, o mesmo conteúdo. Isso me agrada muito. Mas é importante falar que um museu online não é exclusividade do MI: várias outras instituições têm criado acervos online bem legais.
CCSP – Vimos que você se inspirou no perfil espanhol @covidartmuseum. Como foi o processo de concepção do MI com base nesse projeto?
Luiza – O @covidartmuseum foi minha inspiração pro formato do projeto e pras questões mais burocráticas, tipo o formulário de submissão de trabalhos. Mas aquela página tem um recorte temático de falar só sobre o momento de pandemia, e eu queria que o MI expusesse obras que não necessariamente têm a ver com isso. Eu fiz uma opção de idioma diferente também. O @covidartmuseum é uma página espanhola com conteúdo em inglês – pra contemplar arte do mundo todo. Pra mim, fazia mais sentido manter o nosso idioma, porque a proposta é disseminar arte brasileira para o brasileiro. O objetivo é esse!
CCSP – Conte sobre seus projetos e, se possível, dê dicas para quem acha que é impossível consumir arte.
Luiza – Eu tenho outros projetos, sim. Eu tenho o Florindo Linhas, um perfil do Instagram que divulga programações culturais de SP, além de podcasts, vídeos e textos, sempre com o objetivo de desmistificar essa ideia de que arte é só pra especialista. E uma dica pra quem acha que é impossível consumir arte…. Meu, acho que a primeira coisa é convidar a pessoa a perceber que as artes não existem só dentro de um museu, de um quadro, de um poema. Elas nos cercam dos jeitos mais imprevisíveis. Se você acha que “arte” não é pra você, eu te convido a olhar ao seu redor e perceber que tipo de coisa te agrada, te faz sentir bem: alguma música, fotografia, desenho, imagem… Você não precisa necessariamente ir a um museu pra desenvolver um olhar artístico, já está desenvolvendo ele sem perceber. A sensibilidade da experiência artística tem muito a ver com nossa bagagem cultural, histórica, a nossa criatividade e nossas memórias, e isso não é muito dito.
CCSP – Quais rumos podemos esperar do seu projeto para quando essa fase da nossa história passar?
Luiza – Pra responder a essa pergunta, eu tenho que falar o quão oportuno é o nome do projeto: Museu do Isolamento Brasileiro. Essa palavra Isolamento cai como uma luva pra prática artística, já que essa prática às vezes pede um isolamento dentro da própria cabeça, do ateliê, da realidade. E pra que artistas sigam ganhando visibilidade a gente não pode ignorar que a internet não é exatamente democrática: muita gente não consegue acessar um museu online, assim como pessoas de várias idades não curtem ver esse conteúdo online, por exemplo. Por isso, eu acho que a continuidade do MI vai acontecer em outros canais e formatos, inclusive fora do virtual. Meu maior objetivo é conseguir materializar essa exposição em diferentes partes do Brasil, na cidade natal das obras, por exemplo. Mostrar a diversidade cultural do Brasil na própria diversidade cultural do Brasil. Acho que é isso.
Entrevista e texto: Isabela Pretti
Obra da capa: Luna Bastos